quarta-feira, 5 de maio de 2021

Como se defende a honra de Deus?

A resposta está no final do texto.

Paulo Gustavo morreu.
E, sim, teve pastor - talvez levado por motivos políticos/ideológicos - que teve a coragem de assumir que orava pela morte dele, ou que não ia orar pela recuperação dele. Pior ainda é eu, como assembleiano, ler que se trata de um pastor assembleiano de Alagoas se prestando a isso, sob a alegado de estar "defendendo a honra de Deus".

Só digo uma coisa: Daniel Berg e Gunnar Vingren, fundadores da Assembleia de Deus (esses que visitavam presos e pessoas doentes - leiam suas biografias) orariam pela cura dele para, em seguida, anunciarem o Evangelho. Esse sempre foi o padrão, que, infelizmente, tá deixando de ser.

Em minha pesquisa, cansei de ler histórias de perseguidores ou críticos às pessoas de Berg e Vingren (ou qualquer outro pioneiro da igreja), receberem orações desses homens de Deus. Com essas boas ações em sentido contrário, o preconceito/bullying religioso que os crentes da Assembleia de Deus sofriam ia ruindo.

Paulo Gustavo era de esquerda? Era. Era gay? Era. Detestava conservador? Sim. Detestava evangélico? Talvez; não sei. Provavelmente ele nem falaria comigo por discordamos em alguns valores. Mas era uma criatura de Deus, e nenhum rótulo político/identitário anula a importância de um ato de caridade espiritual que naturalmente é (ou deveria ser) um dever nosso, como cristãos - como imitadores de Cristo.

Me lembro que lendo Atos dos Apóstolos, vi que Ananias não queria orar por Paulo, aquele que perseguia cristãos, que se encontrava cego. No entanto, engoliu o ego e fez o seu dever: orou por Paulo e, após isso, ele teve sua saúde ocular recuperada. Isso não foi deixado escrito na Bíblia - nossa regra de fé de conduta - por acaso.

Eu oraria por alguém do Porta dos Fundos, pelo Felipe Neto, etc., não por ser o bonzinho, ou por vomitar nobreza, querer cliques ou likes, mas sim pq esse ato em si é pôr em prática a mensagem do Ministerio da Reconciliação que Cristo me confiou.

Teremos vergonha do momento que vivemos. Como crente assembleiano, só me cabe pedir desculpas sobre posturas de uns, mas a história da nossa igreja não é essa. E ainda bem que a postura da maioria dos pastores é de orar por todos - pq eu vejo isso. Mas me espanta ver em casos isolados atitudes contrárias. 

A melhor forma de defender a honra de Deus é não trazer envergonha para o nome de Cristo, Seu Filho, nem pra Sua Igreja. A outra forma é de levar criaturas à reconciliação com Seu criador, uma vez que Deus não tem prazer na morte de um ímpio. 

Às famílias das mais de 400 mil vítimas fatais (e outros milhares não oficiais) dessa e de tantas outras doenças, dirijo minhas mais sinceras orações.
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Sobre as biografias de Berg e Vingren:
Enviado por Deus - Memorias de Daniel Berg (CPAD)
Diário de Pioneiro - Gunnar Vingren (CPAD)

quarta-feira, 14 de abril de 2021

O AJUSTE DE CONTAS NO BRASIL PÓS-PANDEMIA: PRECISAREMOS FAZER NOSSA NUREMBERG!

A essa altura do campeonato, CPI da pandemia é pouco.
A essa altura do campeonato, impeachment é pouco.
A essa altura do campeonato, renúncia é pouco.

Tudo isso é paliativo de uma obrigação moral maior.

O tempo pra isso passou e era até meados do ano passado, quando Bolsonaro demitiu Mandetta, forçou a demissão de Teich, lutou contra as medidas preventivas e restritivas e deixou por meses a pasta da Saúde sem um titular durante uma pandemia.
O tempo para isso foi quando o Brasil foi o único caso no mundo a ter um “pico” constante de mil mortes durante 4 meses.

O que agora acontece no Brasil não se limita mais a erros políticos ou erros de responsabilidade fiscal. Não falo de Fiat Elba, nem das pedaladas fiscais. Tudo isso é pequeno perto da maldade contra um país. É caso de “ponerologia” – nome talvez desconhecido pra muitos de vocês. Significa psicopatia política; o uso político sistemático do mal para fins de controle; o que ocorre de errado não é por erro, mas por estratégia.

Após o fim do governo Bolsonaro, se o Brasil possuir o mínimo de civilidade ocidental, ele deveria ir direto para o banco dos réus de um Tribunal Extraordinário. Não somente ele, mas todos seus cúmplices.



Sim, cúmplices! Nisso incluo empresários apoiadores como *** e donos/executivos de emissoras de rádio e tv e seus diretores de jornalismo, que após seus veículos de imprensa começaram a receber generosas verbas estatais de propaganda, adotaram uma linha editorial que defende o indefensável. Estou me referindo ao negacionismo ilustrado em várias formas e vários graus com roupagem de jornalismo.

Seus agentes de propaganda que fizeram militância da morte em seus microfones e, com isso, empurraram milhares de pessoas para a morte, tais como Caio Coppolla, R. Constantino, G. Fiuza, A. Garcia, Renata Barreto, Ana P. Henkel, etc, também devem constar.

Será que o "engasgamento matou mais que a covid-19 ano passado"? Essa é clássica, e vocês sabem a qual desses jornalistas/comentaristas me refiro. Uma outra pessoa daí falando que lockdown não funciona. Um outro colocando em dúvida o uso de máscaras. E quase todos usando artigos científicos, rechaçados por pares de quem os publicaram. Mas, acima de tudo, pelo que vemos os progressos na Coreia do Sul, Japão, EUA e Israel. A boa ciência se impõe.

Foram escolhas que estes atores fizeram durante todo o período da pandemia. Escolhas conscientes, pois burros eles não são.

Esse ajuste de contas tem seu exemplo máximo expresso no Tribunal de Nuremberg (foto) que funcionou de 20 de novembro de 1945 a 1º de outubro de 1946. Esse tribunal foi montado imediatamente após o fim da II Guerra por forças internacionais para julgar crimes de nazistas.

Temos um exemplo recente e de um vizinho. Com a redemocratização da Argentina (1983), Jorge Rafael Videla foi para o banco dos réus. Ele e seus cúmplices. Em 1985 veio a condenação à prisão perpétua por crimes contra a humanidade. Isso é outro exemplo de ajuste de contas.

Infelizmente isso não houve contra Lênin, Stálin, dinastia dos Kim’s da Coreia do Norte, Mao Tsé-Tung, F. Franco, Guevara, F. Castro. Esses sacripantas escaparam de um tribunal.

O fascista B. Mussolini e o comunista N. Ceausescu nem foram para os tribunais – o povo italiano e romeno, respectivamente, os mataram, e em praça pública. Não é esse o caminho para o Brasil, pois tais, de fato, eram ditadores.

E o que aconteceu na ingerência federal do Brasil no combate à pandemia foi um crime contra um povo, contra uma nação. Além dos itens já mencionados, por último, temos o boicote à vacina. Desde agosto, mais de 160 milhões de doses da Pfizer e Coronav foram oferecidas ao governo que relutou em comprar.

Brasil é “Top 2” mundial em vacinação, pelo número de vacinados, capilaridade do sistema de saúde e velocidade de imunização. Tradição essa consolidada nas últimas 4 décadas. Milhões de doses seriam aplicadas desde dezembro, poupando vidas, choros e despedidas inesperadas.

E nosso histórico combate às pandemias, epidemias e endemias? Controlamos uma peste negra no início do século XX (que teve influência na fundação do Butantan), uma gripe espanhola em 1918-19, febre amarela, malária, sarampo, paralisia infantil, etc.

Chegamos até mesmo a erradicar a dengue nos anos 1950, sendo nós um país miserável, subdesenvolvido, de terceiro mundo. E muito mais miserável que hoje e mesmo assim sempre fomos referência mundial – talvez a única coisa que funcione nesse país. Ou, funcionava.

O que coloca em risco esse ajuste de contas é o revanchismo ideológico, principalmente do PT e seus partidos satélites (como PSOL e PCdoB), movidos pelo ódio de um processo da operação Lava-Jato, do legítimo de impeachment de 2016 contra Dilma, das derrotas da agenda reformista (trabalhista e previdenciária), da prisão do Lula e das derrotas eleitorais das últimas três eleições, em especial da de 2018.

Lula e seus aliados (mas pode ser qualquer ator político com discurso de revanche) caso vençam a eleição de 2022 ou 2026, misturarão tudo isso com a sabotagem sistemática do Bolsonaro e seus aliados no combate à pandemia. Não coloco como hipótese, mas como certeza, pois os pronunciamentos não mudam em nada à narrativa/retórica adotada e potencializada desde 2016.

E esse bonde da história não podemos perder.

Essa indignação geral que hoje se forma e une o Brasil em torno de uma justiça pelos seus mortos – muitas dessas dezenas de milhares de mortes, evitáveis – não pode ser pervertida para fins políticos, tornando-se um tribunal revolucionário. Esse é o risco. Se tiver esse desvio, essa busca pela justiça perderá força e legitimidade.

Morreu gente pobre e rica; de direita e de esquerda; quem votou 13 e quem votou 17; do crente ao ateu; do pastor ao babalorixá; de jovens a idosos; do analfabeto ao acadêmico; do sulista do IDH alto ao nortista caboclo – e ambos morreram sem oxigênio, e sem vacina. A morte foi indistinta.

Falo por Manaus, minha cidade. Entre dezembro e início de janeiro, enviamos ao Ministério da Saúde uma comunicação de urgência que faltaria oxigênio e o governo federal de forma patética nos deu cloroquina. A partir do dia 14 e nas três semanas seguintes de janeiro/fevereiro, o Brasil e o mundo assistiam horrorizados as cenas de Manaus.

Esse ajuste de contas deve servir pra unir o país e conscientizar aqueles “poucos” (que se tratando do Brasil são “muitos milhões”) que ainda relutam em acreditar no que acontece.

Que o Brasil tenha sua “Nuremberg” com espírito da Corte Penal Internacional de Haia. Moralmente é essa minha expectativa. Talvez eu esteja esperando demais do Brasil e do brasileiro comum. Não sei se terá e, se tiver, como será. Mas até o desfecho descanso, pela fé, nessas palavras: “Bem-aventurados os que choram, porque eles serão consolados; (...) Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque eles serão fartos (...)” (Mateus 5:4,6).
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Por José Andrews, historiador e professor.
Instagram: @joseandrewsreal // Twitter: @eujoseandrews


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*Quando escrevi esse texto em minha página no Facebook, no dia 30/03/21, o Brasil tinha 317 mil mortos por covid-19 em números oficias; hoje, dia 14/04, são 358 mil.


sábado, 31 de outubro de 2020

31 de Outubro: Lutero e a publicidade de problemas internos da igreja.

Lições, legados e fronteiras éticas para pentecostais inseridos em ambientes religiosos cada vez mais radicalizados em feudos episcopais (e hereditários).

Em tempos de pós-verdade, nos deparamos com uma crescente alienação política (no sentido de posicionamento perante a congregação) entre os fieis, pois assimilam várias situações como uma só e sempre favorável à narrativa de suas lideranças espirituais. Um bom exemplo disso é confusão entre obediência e “subserviência”, “cumplicidade”, “apoio branco” ou, ainda, “chapa-branquismo”.

Outro exemplo é confusão de contestação a desvios de lideranças com “revolta contra Deus”. Cada um desses termos tem suas significações absolutas e próprias, mas, como já disse, vivemos na era da pós-verdade. Óbvio que essas confusões conceituais não são formuladas pelos leigos, mas sim pelas lideranças eclesiásticas que os doutrinam e formam sua visão de mundo. Ou depende do tipo de liderança.

Líderes que não gostam de ser questionados, usam da coação psicológica e de uma “terrologia” que desestimulam posicionamentos públicos de fiéis descontentes. Uma vez que as estruturas religiosas estão cada vez mais radicalizadas no bloqueio de questionamentos/críticas internas e na concentração de poder na mão de um só líder, sua família e seu grupo político de apoio, não deixam espaço para fiéis se expressarem, restando a esses últimos recorrerem à arena pública.

E isso nos remete a um ato protagonizado por um sacerdote agostiniano, em 31 de outubro de 1517. Martinho Lutero fixou suas 95 teses na porta da Igreja do Castelo de Wittenberg, resultando na Reforma Protestante. E é interessante realçar 3 fatos grandiosos nesse gesto: foi um ato público, tinha críticas teológicas e eclesiásticas e ele fez isso sozinho – todos os ingredientes identitários de um crente “rebelde” se o mesmo fizer a mesmíssima coisa em relação às suas lideranças. Se não é assim em todos os casos, pelo menos na maioria é.

Na era da internet lideranças eclesiásticas não gostam de ver seus fiéis, como um todo, colocando em redes sociais seu descontentamento. E uma grande parte desses fiéis fazem isso de forma imprudente, o que acaba legitimando a negativação total – inclusive dos que fazem suas manifestações públicas de forma equilibrada e dentro da ética cristã.


O irmão tem que orar e não ir pro Facebook postar seu descontentamento”, dizem muitos papas pentecostais – não é exagero, pois há um número crescente dos que até mudam estatutos pra serem presidentes vitalícios. Lutero não ficou somente orando e jejuando até o ano de sua morte (1546) para que a igreja romana, que vinha se corrompendo e corrompendo há séculos, se concertasse. A Santa Sé não queria isso, inclusive nos três séculos anteriores ela esmagou tentativas de reformas internas.

Grupos como valdenses, albigenses, anabatistas, etc., foram trucidados. John Wycliffe foi perseguido o resto da vida escapando por pouco das garras assassinas dos inquisidores. Seus discípulos, conhecidos como lolardos, foram exterminados, incluindo o John Huss que foi preso de forma covarde e martirizado. E já no tempo em que Lutero era jovem, e decidindo seu futuro profissional, Jeronimo Savonarola, padre em Florença, estava promovendo uma reforma moral local e foi morto pela Santa Sé (em 1498).

Assim, a Reforma nunca vingou. E quem sabe um pouco de história desses movimentos e dessas personalidades, sabe que tinham uma vida piedosa e de oração. Lutero sabia com que forças estava lidando. Quando falo em fronteiras/limites da ética cristã nesse caso, refiro-me à capacidade do indivíduo se portar com coragem e altivez pautado pelas Escrituras diante de chefes religiosos que também usam as Escrituras, mas parte dela.

Um fator que desse ser notado é que Lutero não estava ali, no dia 31 de outubro de 1517, para simplesmente contender – o que já ruim de todas as formas –, mas para declarar o erro – o que já causa grandes incômodos. Para os lobotomizados essas duas coisas são a mesma atitude. Parecem, mas não são. Lutero foi propositivo: apontou os desvios que ele enxergava e apontava soluções que estavam nas Escrituras.

Respeitou a autoridade do papa e se propôs ao debate sobre cada uma de suas teses. Propôs-se a ir ao debate, recebeu a intimação a ir e foi. Na Dieta de Worms, em 16 de abril de 1521, Martinho Lutero, na presença do poderoso imperador Carlos V, cercado de inimigos e pressionado por Johann Eck a renunciar seus escritos, declarou:


A menos que possa ser refutado e convencido pelo testemunho da Escritura e por claros argumentos (visto que não creio no papa, nem nos concílios; é evidente que todos eles frequentemente erram e se contradizem); estou conquistado pela Santa Escritura citada por mim, minha consciência está cativa à Palavra de Deus: não posso e não me retratarei, pois é inseguro e perigoso fazer algo contra a consciência. Esta é a minha posição. Não posso agir de outra maneira. Que Deus me ajude. Amém!”.



Lutero não foi pra nenhuma rede social (Facebook, Instagram, Twitter, etc) para postar seus descontentamentos teológicos e eclesiásticos – uma vez que elas não existiam – mas ele usou a mídia mais revolucionária de sua geração pra espalhar suas teses e sua posterior produção teológica: a imprensa, inventada em 1450 por Johannes Gutemberg. Outros reformadores que surgiram em outras regiões da Europa também utilizaram essa mídia.

E a Igreja Católica, que perdera o monopólio da informação e, consequentemente, da narrativa, sentiu o peso da mídia. Tempos depois, na Contrarreforma, a Cúria absorveu muitas teses de Lutero.

Irmão, falar essas coisas dá escândalo”. Errado, quem comete escândalo não é quem denuncia, mas quem comete. Não foi Samuel que cometeu o escândalo ao falar a saul de seus pecados e consequência – tudo isso em público; quem cometeu escândalo foi Saul. Natan não cometeu o escândalo ao confrontar Davi em sua corte; quem cometeu o escândalo foi Davi ao adulterar com Bate-Seba e propiciar o assassinato de Urias. É interessante que Davi se quebrantou e se reconciliou, pois deu lugar ao arrependimento, e Natan fez muito bem sua parte em não fazer espetáculo sobre erros graves, apesar de aponta-los. Tenhamos discernimento nessas coisas.

Há exemplos bíblicos, como Jeremias (principalmente esse) e Ezequiel, que “bateram de frente” com suas lideranças espirituais, que estavam de alguma forma mergulhados em uma ou outra forma de corrupção. Não ficaram somente orando. Jeremias, nesse oficio foi o que mais sofreu e talvez, por isso, é chamado como o profeta das lágrimas. Mas como a data é sobre a Reforma Protestante, optei fazer um percurso histórico com nomes que circundam essa data.

Qualquer fiel, sem espaço interno para falar, que demonstre seu descontentamento em sua rede social, mesmo pautado na ética, sempre será mal visto por suas lideranças/Ministério. Além de enfrentarem essa força contrária “de cima”, da classe dirigente, esse grupo esclarecido ainda tem que desassociar sua imagem da de crentes neófitos, que não fazem críticas propositivas, apelam pro linchamento moral e que só querem polemizar por polemizar.

O primeiros são uma versão muito melhorada de Lutero (que não foi lá um reformador radical mas, sim, um reformador magistral e intolerante), enquanto os últimos precisam de prudência como a de serpentes e simplicidade como a de pombas (Mt 10:16).

Por José Andrews, graduado em História pela UFAM-Manaus.

domingo, 4 de junho de 2017

50 anos depois

Há 50 anos, a foto de três paraquedistas chegando ao Muro das Lamentações, após a batalha por Jerusalém, tornou-se uma das principais imagens da guerra. No aniversário do conflito, Tzion Karasenti (à esquerda), Yitzhak Yifat (centro) e Chaim Oshri (direita) voltaram à Cidade Velha. Como na época nenhum havia estado no Muro das Lamentações, sob controle jordaniano desde 1948, não sabiam ao certo se tinham capturado o “Muro real”. “Todos falavam do ‘Kotel’, mas aquele dia foi o primeiro em que estivemos lá”, lembrou Oshri. Eles chegaram após 48 horas de combate e muitos começaram a chorar. Só ao fim da guerra descobriram que a imagem se tornara famosa. (Fonte: O Globo)


sexta-feira, 12 de maio de 2017

O dono da banca - biografia de Roberto Civita

Escrita pelo jornalista Carlos Maranhão, a biografia Roberto Civita: o dono da banca, é uma obra interessante para se conhecer um pouco mais dos bastidores da imprensa no Brasil. Principalmente a revista Veja, concebida por Roberto Civita, editor e presidente do Grupo Abril, falecido em 2013.

Uma das revelações do livro, foi a participação de Victor Civita, pai de Roberto, nas fileiras do fascismo. Justificou-se tal adesão ao pavor das ideologias comunistas que atormentavam a burguesia europeia no início do século XX. Essa informação sempre foi omitida por Victor em vida.

Segundo Maranhão, Bob tinha "convicções inabaláveis". Defendia o capitalismo, à democracia representativa, à liberdade de imprensa, o livre-comércio e o liberalismo econômico. Por sua vez, combatia "a presença do Estado na economia e na vida dos cidadãos". E mais: era contra qualquer tipo de censura ou regime autoritário. Socialismo, comunismo, a esquerda e o Partido dos Trabalhadores (PT), também estavam na lista dos indesejáveis do editor da Abril.


Se para bom entendedor meia palavra basta, a lista das convicções de Civita apontam claramente a linha editorial da sua criação maior: a revista Veja. Nela ele "brincava de Deus" e a fazia sua porta-voz. A linha editorial tinha que estar afinada com suas ideias. A publicação deveria influenciar os destinos da política e da economia.

A leitura do livro em si é valiosa para perceber, que o discurso de jornalismo "imparcial", "objetivo" e em busca da "verdade" é pura retórica. A liberdade de escrita e opinião nos meios jornalísticos é delimitada pelo dono da empresa.

Segundo o autor, Civita fez da Veja sua trincheira contra o governo do PT. Em compensação, venerava Fernando Henrique Cardoso, "o seu candidato". Vetou uma matéria sobre o banqueiro Joseph Safra para não desagradá-lo, pois a Abril tinha no Banco Safra um dos seus principais credores.

Em suma: Veja era a "imagem e semelhança" do seu criador. E há quem acredite piamente em plena isenção da semanal...

sábado, 25 de fevereiro de 2017

Kotscho - Do Golpe ao Planalto

Jornalista, assessor de imprensa e amigo pessoal de Luiz Inácio Lula da Silva nas campanhas de 1989, 1994 e 2002, Ricardo Kotscho registrou os principais momentos das disputas eleitorais em seu livro Do golpe ao Planalto: uma vida de repórter (Companhia das Letras, 2006).

Posteriormente com a vitória de Lula, Kotscho tornou-se secretário de Imprensa e Divulgação da Presidência da República. Deixou o governo em 2004 e assistiu de longe à crise política gerada pelas denúncias sobre o "Mensalão".


Repórter experiente e com passagem pelos principais jornais do país, Ricardo conta um pouco do cotidiano da profissão que abraçou no ano do golpe militar em 1964. Empresas de mídia e seus proprietários, bem como os jornalistas com quem conviveu, são descritos nas páginas de sua autobiografia.

Interessante mesmo, é quando Kotscho descreve as versões que os grandes jornais e revistas davam sobre Lula em campanha ou já no exercício dos primeiros anos de mandato (tempo da participação do autor no governo).

Segue abaixo alguns trechos do livro. Obviamente Lula não é o único político a sofrer com isso, mas é importante perceber que a mídia sempre teve má vontade com o petista e seu governo. Algo que ainda se perpetua, mesmo com ele fora do poder.

Nada havia mudado na campanha nem no discurso do candidato, que era o mesmo desde o final de 1988, quando comecei a acompanhar Lula. Ele falava em moto-contínuo, como se fosse um realejo. Ainda assim, analistas e colunistas badalados atribuíram o crescimento nas pesquisas a uma "radicalização" no seu discurso ou à ajuda dos padres no Nordeste. (Kotscho informa como o noticiário pode ser adjetivado para ajudar ou prejudicar alguém - campanha de 1989).

Na noite da chegada de [Mário] Rosa a Vitória da Conquista, na Bahia, o deputado Jaques Wagner (PT-BA) esperava na fila para usar o telefone da portaria do hotel e ouviu uma conversa do enviado especial com algum de seus superiores, na qual ele relatava as dificuldades encontradas para ridicularizar a viagem de Lula mas dizia que mais adiante conseguiria fazê-lo, conforme a pauta. (Repórter da revista Veja com a pauta pronta e objetivos delimitados: desmoralizar Lula - campanha de 1994).

Escrever sobre gafes de Lula passara a ser uma pauta fixa para alguns jornalistas, pouco importando se haviam sido cometidas ou não... "O grave é que a generosa quantidade de detalhes oferecida pelos repórteres na descrição de uma cena que presenciaram pode transformar um fato que não aconteceu em registro histórico...". (Observação de assessor sobre o comportamento da imprensa em relação ao presidente e parte da nota de Ricardo a uma suposta gafe de Lula em viagem ao Oriente Médio - 2003).

segunda-feira, 19 de dezembro de 2016

Mandela e as revisões da História

Alguém em sã consciência ousaria questionar o legado político do líder sul-africano Nelson Mandela? Símbolo da luta contra o apartheid, Mandela, morto em 2013 é reverenciado mundialmente. Mas dentro do próprio país, Madiba já não é mais unanimidade.

A matéria de domingo do jornal O Globo (18/12/2016), destaca os conflitos sociais e étnicos na África do Sul. Oficialmente o apartheid foi extinto no país na década de 1990, mas ainda permanece a segregação entre os brancos e negros.

Mandela: mito contestado em seu próprio país 

Segundo a escritora e feminista Malaika wa Azania "para a geração mais velha Mandela significa um símbolo de liberdade". Porém para os mais jovens, Madiba "representa um arquiteto do mito da nação arco-íris que contrasta com o racismo, uma realidade ainda viva na África do Sul”.

É essa geração que protesta contra o sistema político e entra em choque com a polícia nas ruas. Que deseja a descolonização do ensino e almeja mais avanços sociais. "De forma mais ampla, os manifestantes cobram as oportunidades prometidas com a queda do regime dominado pela minoria branca. E colocam em xeque o legado de Mandela, exibindo um retrato ainda em preto e branco do país" - escreveu a jornalista Carolina Jardim.

Essa é a escrita da História e dos seus personagens. São necessidades e problemáticas do presente ou de uma geração, que determinam as cores das narrativas. Assim, Fidel pode ser herói ou vilão; os militares "salvadores da pátria" ou ditadores mortais; Getúlio "pai dos pobres" ou "mãe dos ricos"; Lula estadista ou grande demagogo; Dilma vítima de impeachment constitucional ou de golpe político.

Vale refletir sobre isso sempre...